Suassuna: o contador de Taperoá


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O poeta, romancista e dramaturgo paraibano Ariano Suassuna é um grande contador (e cantador) da cultura nordestina. Lírico e irreverente, adoro ler tudo que ele produz. As peças de teatro são engraçadíssimas e boas de ler, num sopro, para aqueles dias em que nós não queremos nada de muito sério. Deixo-os com um trecho de cena da “Farsa da Boa Preguiça”. Na história, o poeta Simão, preguiçoso profissional, é casado com dona Nevinha, mulher simples, que trabalha na fazenda de dona Clarabela. Amante das artes e moradora da cidade, Clarabela chega à fazenda com a cabeça cheia de ideias dos cursos que faz, querendo conhecer o tal do poeta Simão. O argumento do “boa-vida” Simão pela simplicidade é digno de um estudo filosófico. A grande pergunta é: vale a pena morrer de trabalhar se o que a gente mais precisa, que é a vida boa, fica esquecida?

CLARABELA: Ah, a mulher do Poeta! Vê-se logo!
Me diga uma coisa: a senhora compreende seu marido?
Que é que a senhora faz para ajudá-lo?

NEVINHA: Ajeito o feijão, quando tem,
Tiro espinho do seu pé,
Cuido dos meninos, faço a ponta dos lápis,
Quando ele pede, eu dou cafuné...

CLARABELA: Mas não me diga que a senhora não o inspira!

NEVINHA: Como é, dona Clarabela?

CLARABELA: Eu estou perguntando se a senhora inspira seu marido!

NEVINHA: Oxente, dona Clarabela, quer encabular meu pensamento?
Alegria de pobre é essa mesmo!
Não é da lei do casamento?
Mas é melhor a gente acordar Simão, que eu sei que a senhora quer conhecer os versos dele.
Simão! Simão! Acorde, homem de Deus!