Hoje foi a vez de Hugo de Brito Segundo trazer uma colaboração para nossa “roda de leitura” aqui no blog. A poesia que vem a seguir dialoga com o texto de Manuel da Fonseca, publicado ontem no Ler para Contar. Achei que a poesia de Antônio Roberto Fernandes merecia ultrapassar a barreira dos comentários e ocupar um post sozinha, dada a beleza poética das palavras. Aproveito para agradecer o amigo Hugo pelo texto e pela nova descoberta literária: muito obrigada!
MAS...
Por Antônio Roberto Fernandes
E eu que achei que a lua não brilhasse
Sobre os mortos no campo da guerrilha
Sobre a relva que encobre a armadilha
Ou sobre o esconderijo da quadrilha,
Mas, brilha...
Eu achei que nenhum pássaro cantasse
Se um lavrador não mais colhe o que planta
Se uma família vai dormir sem janta
Com um soluço preso na garganta,
Mas, canta...
Também pensei que a chuva não regasse
A folha cujo leite queima e cega
A carnívora flor que o inseto pega
Ou o espinho oculto na macega,
Mas, rega...
Pensei também, que o orvalho não beijasse.
A venenosa cobra que rasteja
No silencio da noite sertaneja
Sobre as ruínas da esquecida igreja,
Mas, beija...
Imaginei que a água não lavasse
O chicote que em sangue se deprava
Quando de forma monstruosa e brava
Abre trilha de dor na pele escrava
Mas, lava...
Apostei que nenhuma borboleta
Por ser um vivo exemplo de esperança,
Dançaria contente, leve e mansa.
Sobre o túmulo
Em flor de uma criança,
Mas, dança...
Por isso achei que eu não mais fizesse
Poema algum após tanto embaraço
Tanta decepção, tanto cansaço.
E tanta esperança em vão por teu abraço,
Mas, faço...
Juliana,
Somente hoje estou fazendo a "visita" prometida.
Parabéns pelo espaço dedicado à literatura. É importante.
Esta última temática fez-me lembrar do "Velho Tema" (Vicente de Carvalho):
"Só a leve esperança em toda a vida
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos."
Forte abraço.
Jânio.
Caro Jânio, é um prazer vê-lo por aqui. A literatura não só é importante, como me parece a única salvação para o tédio desta vida. Obrigada pelo poema. Grande abraço!