O post é grande, mas (acredito) necessário. Fortaleza viveu, em 3 de janeiro de 2012, um dia de fragilidade e medo. Uma boataria sobre arrastões alimentada pelo pânico da violência fez com que a cidade parasse. Não que inexistissem assaltos, bandidos, a falta de ordem, mas o clima de guerra civil era injustificado. Pensei que o terror é, sem dúvida, o maior obstáculo à liberdade. Os regimes de exceção surgiram, na história, motivados pelo medo, um medo quase sempre associado à ignorância. Lembrei-me de um romance fantástico que li há algum tempo que pode ser útil para essa reflexão, do escritor sul-africano J. M. Coetzee, ganhador do prêmio Nobel de literatura em 2003. A obra chama À Espera dos Bárbaros.
O personagem principal, o magistrado de uma pequena cidade pacífica, enfrenta a violência do Estado no enfrentamento do que seria uma “sedição” de bárbaros nômades, habitantes de uma montanha próxima. Em nome da paz, o coronel Joll e os seus subordinados subvertem a organização social, limitam direitos, expoliam, reduzem pessoas à indignidade, argumentando que a proteção contra os bárbaros assim o exige. Os bárbaros, na História, são como o medo: uma ideia não personificada. Literatura de alto nível para fazer pensar.
“Tem havido choques com patrulhas da fronteira. As tribos bárbaras estão se armando, dizem os rumores; o Império devia tomar medidas de precaução, porque certamente vai haver guerra.
Dessa inquietação eu mesmo não vi nada. Em particular observei que uma vez em cada geração, sem falhar nunca, há um episódio de histeria ligado aos bárbaros. Não existe mulher que viva perto da fronteira que não tenha sonhado com uma escura mão bárbara saindo de sob a cama para agarrar seu tornozelo, não existe um homem que não se assuste com visões dos bárbaros farreando em sua casa, quebrando os pratos, tocando fogo nas cortinas, estuprando suas filhas. Esses sonhos são consequência de muito ócio. Mostre-me um exército de bárbaros que então eu acredito”.
A comparação é excelente, amor. :)
;)