O Espelho e a Sombra


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Sexta-feira é dia de boa literatura, e deixo com vocês um trecho do conto “Não há sombra no espelho”, do grande escritor uruguaio Mario Benedetti, publicado na coletânea Correio do Tempo (Alfaguara).


“Não é a primeira vez que escrevo meu nome, Renato Valenzuela, e o vejo como se fosse de outra pessoa, de alguém distante com quem perdi contato faz tempo. Em outras ocasiões, diante do espelho, quando acabo de me barbear, vejo um rosto que mal reconheço, como se fosse o esboço ou a caricatura de outro rosto, com que estou mais ou menos acostumado. Então acho que esse olhar não é o meu, que essas pupilas de rancor não me dizem respeito, que essas rugas pertencem a outra máscara, que esses fiordes de calvície não correspondem à minha geografia capilar. É verdade que tais divagações costumam ser momentâneas, metamorfoses que duram o tempo de um suspiro, mas sempre me deixam instável, desassossegado, indefeso. É por isso, Renato Valenzuela, que talvez tenha chegado a hora de acertar as nossas contas. Com o tempo, com o passado, com as feridas, com as promessas, contigo/comigo. Todas.”

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  1. Anônimo
  2. Beatriz Fonteles