Pessoas
mais introspectivas, envolvidas com trabalho intelectual ou não, estão sempre
precisando de tempo para o ócio: oportunidades para ficar à toa, olhando para o
teto, ir ao cinema ver um bom filme, ler um livro por prazer, tomar um café no
fim de tarde, exercícios de autoconhecimento e tempo para ouvir os próprios
pensamentos. O texto que trago hoje, de autoria do escritor mineiro Campos de
Carvalho, escrito por ocasião de sua viagem a Londres, traduz com primor
literário a importância desses momentos do eu-sozinho. Boa quinta-feira!
“Quando empreendi esta viagem, sentia-me,
no mínimo, um novo Colombo um pouco mais céptico, sem dúvida: e esperava
encontrar mundos novos no Velho Mundo ou pelo menos um simulacro deles, algo
como uma miragem que me fizesse esquecer de mim mesmo – e de meus oito ou nove
anos de silêncio. Aqui estou, nu como vim, apenas seis meses mais velho e nu –
mas algo me dizendo que sob a minha nudez estou grávido de mil coisas e (o que
é mais importante) que já estava grávido quando aqui cheguei e muito antes de
ter sequer sonhado em romper com o meu passado. Vim aqui ver, e não vi, o que
só podia estar dentro de mim e não em qualquer geografia: a face oculta do sol
e de todas as luas, o outro lado do espelho e o rio subterrâneo que corre sob
cada rio: a palavra mágica e insabida que um dia, sem querer, proferirei e me
revelará mais do que a própria Morte: o ovo de pássaro que mesmo o mais
deserdado de nós traz nas suas entranhas, e que no artista se chama intuição,
gênio, loucura ou simplesmente alma”. (CARVALHO, Campos de. Cartas de Viagem e Outras Crônicas, José
Olympio Editora, 2006, pg. 24)
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