Quando li Jorge Amado pela primeira vez na adolescência, por dever escolar, não gostei do estilo nem da temática do autor: tudo me parecia excessivamente vulgar, uma literatura sem maiores elaborações estéticas. No auge do desespero em busca de algo bom pra ler, eis que me vejo escolhendo um romance do autor baiano, na esperança de que uma nova leitura, mais madura, pudesse me reconciliar com a sua literatura. Li A morte e a morte de Quincas Berro Dágua em pouco mais de duas horas, achando delicioso e morrendo de rir das peripécias do defunto festejador. O que se vê nas páginas da novela é uma literatura muito sofisticada, e o que me pareceu vulgar naquela leitura de adolescência é, na verdade, uma prosa muito fluente, leve, fácil, que revela um profundo domínio sobre a língua e sobre a cultura popular da Bahia. Terminei o livro com a vontade de esgotar toda a obra do autor! Quincas Berro Dágua é o completo malandro do cais de Salvador: beberrão, libertino, deixou mulher e filha (duas jararacas, no dizer de Quincas) para ter uma vidade alegrias e liberdades. Até depois de morto o malandro apronta das suas e o seu velório tem direito a uma festança regada a cachaça e muito amor. Para morrer de rir.
“Era o cadáver de Quincas Berro Dágua, cachaceiro, debochado e jogador, sem família, sem lar, sem flores e sem rezas. Não era Joaquim Soares da Cunha, correto funcionário da mesa de rendas estadual, aposentado após vinte e cinco anos de bons e leais serviços, esposo modelar, a quem todos tiravam o chapéu e apertavam a mão. Como pode um homem, aos cinquenta anos, abandonar a família, a casa, os hábitos de toda uma vida, os conhecidos antigos, para vagabundear pelas ruas, beber nos botequins baratos, frequentar o meretrício, viver sujo e barbado, morar em infame pocilga, dormir em um catre miserável?” (Editora Cia das Letras, 2008, pg. 24)
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