Archive for junho 2012

Sexta dos Amores Boêmios: Chico Buarque

jun
2012
29

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A Arte Crítica: Ferreira Gullar

jun
2012
28

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Ferreira Gullar, além de poeta, é um grande crítico de arte e tem escritos muito lúcidos sobre estética que valem a leitura atenta. Gullar elucida questões como vanguarda, arte-conceitual e todas as falácias relacionadas ao emprego desses termos, ao nos alertar que existe, sim, o belo e o seu oposto em arte, e que nem toda crítica ao novo é necessariamente “passadista”. Para quem se interessar, é muito boa a leitura do livro de Gullar chamado Sobre arte, sobre poesia (Uma luz no chão), publicado pela José Olympio. O texto abaixo me fez lembrar um autoproclamado poeta cearense que, certa vez, num café cheio de ouvintes deslumbrados, apresentou uma ideia brilhante por ele concebida: um artigo de uma revista literária que foi apresentado em branco, com os seguintes dizeres “este espaço estava reservado para fulano de tal, mas ele não apareceu”. Genial, não é? A literatura que é não literatura.




“Como se pode concluir do que foi dito, deu-se uma inversão de valores no âmbito da avaliação e mesmo da concepção artística, já que a obra deixou de impor-se pelas qualidades estéticas, por sua execução, por sua complexidade, pela adequação da forma e conteúdo, para valer apenas pelo que trazia de “novo” e que, na maioria das vezes, limitava-se à busca deliberada do extravagante e do diferente. Não é difícil adivinhar que tal concepção conduziria fatalmente à desintegração das linguagens artísticas e a um vale-tudo que eliminava qualquer avaliação objetiva”. (GULLAR, F. Sobre arte, sobre poesia (uma luz no chão), José Olympio, pg. 14)

Os Mil Amores de Livia Garcia-Roza

jun
2012
27

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Já falei sobre a escritora carioca Livia Garcia-Roza em outro post e aproveito o dia de hoje para apresentar mais um romance de sua autoria, chamado Milamor. As personagens mais marcantes da obra de Livia fazem parte de um universo profundamente feminino, urbano, lírico e muito sofrido. No romance Milamor, temos a história de Maria, uma mulher madura de filhos já adultos, viúva, que redescobre o amor e a paixão. O cotidiano tedioso de Maria é ricamente descrito a partir da perspectiva da personagem: o ócio, a falta de energia, a vivência do passado como maior passatempo. Acompanhamos a transformação emocional de Maria com a chegada de Alencar, as palpitações, a ansiedade, o doce gosto das fantasias. Um romance muito delicado que vale a leitura. As mulheres vão se reconhecer na escrita de Livia Garcia-Roza, os homens podem aprender um pouco sobre universo afetivo do sexo oposto. Boa quarta!




“Moramos bem, minha filha e eu, num bom apartamento, espaçoso, claro e vazio, porque ela não gosta de móveis. Precisa se locomover – nos poucos momentos em que passa em casa –, sem nada ao redor, na amplidão. Na verdade, aqui no alto, moramos eu e as samambaias, com quem troco ideias diárias. E recebemos duas visitas, a de Maria Inês e da diarista. Sim, porque minha filha trabalha o dia inteiro e quando termina o expediente emenda a noite com os colegas. Conversar comigo é raro. Quando começo a falar – se não for para me queixar de alguma dor –, ela se desinteressa, instantaneamente. Está sempre apressada, até o café da manhã ela toma em pé, ao lado da porta de entrada. Sábado e domingo passa o tempo todo no computador, ou no telefone. O que me vale é ter cultivado amizades ao longo da vida.” (Editora Record, 2008, pg. 8)

Gentileza de Passarinho: Rubem Braga

jun
2012
26

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Terça-feira pode ser um dia para delicadezas literárias. Nada melhor que uma crônica do Rubem Braga, chamada O Conde e o Passarinho, publicada na obra homônima.




“Devo confessar preliminarmente que, entre um conde e um passarinho, prefiro um passarinho. Torço pelo passarinho. Não é por nada. Nem sei mesmo explicar essa preferência. Afinal de contas, um passarinho canta e voa. O conde não sabe gorjear nem voar. O conde gorjeia com apitos de usinas, barulheiras enormes, de fábricas espalhadas pelo Brasil, vozes dos operários, dos teares, das máquinas de aço e de carne que trabalham para o conde. O conde gorjeia com o dinheiro que entra e sai de seus cofres, o conde é um industrial, e o conde é conde porque é industrial. O passarinho não é industrial, não é conde, não tem fábricas. Tem um ninho, sabe cantar, sabe voar, é apenas um passarinho e isso é gentil, ser um passarinho”.

Vida ao Ar Livre: Winslow Homer

jun
2012
25

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É tempo de férias. Toda a beleza das obras de Winslow Homer.



Leitores do Mundo: Roger Chartier

jun
2012
24

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Aproveito a preguicinha do domingo para indicar uma interessante entrevista como o francês Roger Chartier sobre o hábito da leitura. Neste link.






Tragédia Italiana: Madama Butterfly

jun
2012
23

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A ópera Madama Butterfly foi criada pelo italiano Giacomo Puccini, sendo interpretada pela primeira vez no começo do século XX, em Milão. A ópera tem como enredo a tragédia de Butterfly, uma gueixa que se apaixona por um oficial americano, Benjamin Pinkerton. O americano resolve tomar Butterfly como esposa. Leviano, interessado na jovem gueixa apenas para aplacar seu desejo, Pinketon não tem planos de permanecer no Japão por muito tempo. Após três anos de abandono, o oficial volta a dar notícias, quando a terrível tragédia se abate sobre a pobre Cio-Cio-San. A ópera é organizada em três atos e assisti ao espetáculo preparado pela Royal Opera House, exibido em 3D pela UCI, que tem a magnífica Liping Zhang como intérprete de Butterfly. Uma história para chorar até as entranhas de tanta beleza.








Para descobrir mais: www.madambutterfly3d.com

Sossego de Chuva: Pessoa

jun
2012
22

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Para os melancólicos de plantão.



Fernando Pessoa


Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva
Não faz ruído senão com sossego.
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva
Do que não sabe, o sentimento é cego.
Chove. Meu ser (quem sou) renego...

Tão calma é a chuva que se solta no ar
(Nem parece de nuvens) que parece
Que não é chuva, mas um sussurrar
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece.
Chove. Nada apetece...

Não paira vento, não há céu que eu sinta.
Chove longínqua e indistintamente,
Como uma coisa certa que nos minta,
Como um grande desejo que nos mente.
Chove. Nada em mim sente...


Amor de Romance: José e Pilar

jun
2012
21

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O filme/documentário José e Pilar, de Miguel Gonçalves Mendes, é um primor de delicadeza e sentimento: um olhar sobre o amor imenso entre o escritor José Saramago e sua Pilar, companheira e empresária (ou seria assessora de imprensa?). Sem mais palavras, porque esses últimos dias têm sido de silêncio. Para continuar acreditando no amor e na força do espírito feminino.

O Fogo de Vadinho

jun
2012
19

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Um pouco da malandragem de Vadinho, o mais irresistível dos pilantras da literatura nacional.




Revelava-lhe um mundo apenas suspeitado de prazeres proibidos, ganhando a cada noite de namoro uma parcela de sua resistência e de seu corpo, de seu pudor, de sua oculta emoção. O desejo a consumia numa fogueira de altas labaredas, ardiam brasas em seu ventre, mas Flor buscava conter-se e coibir-se. Sentindo-se, entretanto, dia a dia menos senhora da sua própria vontade, de recusa frágil, relutância débil, submissa escrava do rapaz audacioso, que já se apoderara de quase todo o seu corpo queimado de uma febre sem remédio, ai, sem remédio.” (JORGE AMADO, Dona Flor e seus dois maridos, Cia das Letras, 2008, pg. 95.)

Amor de Poeta

jun
2012
18

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A ausente
Vinícius de Moraes

 Amiga, infinitamente amiga
Em algum lugar teu coração bate por mim
Em algum lugar teus olhos se fecham à idéia dos meus.
Em algum lugar tuas mãos se crispam, teus seios
Se enchem de leite, tu desfaleces e caminhas
Como que cega ao meu encontro...
Amiga, última doçura
A tranqüilidade suavizou a minha pele
E os meus cabelos. Só meu ventre
Te espera, cheio de raízes e de sombras.
Vem, amiga
Minha nudez é absoluta
Meus olhos são espelhos para o teu desejo
E meu peito é tábua de suplícios
Vem. Meus músculos estão doces para os teus dentes
E áspera é minha barba. Vem mergulhar em mim
Como no mar, vem nadar em mim como no mar
Vem te afogar em mim, amiga minha
Em mim como no mar...

Vamos dançar?

jun
2012
16

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A Jogatina de Dostoiévksi

jun
2012
13

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Segunda à noite, apesar da fadiga ocular que desenvolvi nas duas últimas semanas, precisava muito ler algo bom e fui vasculhar as prateleiras de casa em busca de algum livro que não tivesse lido ainda, dos que vieram morar comigo quando casei. Escolhi Um Jogador, do grande escritor russo Fiódor Dostoiévski, traduzido do russo por Boris Schnaiderman para a Editora 34. Foi uma escolha iluminada, o livro é absolutamente primoroso e não pude largá-lo desde então. A história do protagonista-narrador, Aleksiéi Ivânovitch, passa-se numa pequena cidade alemã, apresentada como uma Estação das Águas, espécie de cidade-spa para aristocráticos ricos fugirem do inverno rigoroso. Aleksiéi é preceptor de uma família de nobres russos, à beira da falência, que espera ansiosamente pela morte da tia rica para que herança possa salvá-los da miséria. A relação que se desenvolve entre o narrador e os demais personagens é ricamente descrita por Dostoiévksi, com ironia e superioridade de espírito: a trama que se desenvolve é como uma grande comédia a que Aleksiéi tem o prazer de observar de perto. Segundo Fluxo do Pensamento me disse, Aleksiéi está em pleno episódio maníaco, materializado no descontrole emocional manifesto pelo narrador quando está à mesa do jogo. Grande leitura!




“Sei muito bem que não sou avarento; creio mesmo que sou perdulário; e, no entanto, com que tremor ouço, de coração opresso, os gritos do crupiê: trente et um, rouge, impair et passe; ou: quatre, noit, pair et manque! Com que avidez olho para a mesa de jogo, em que estão espalhados friedrichsors e táleres; para as pilhas de ouro, que quando trocadas pela pazinha do crupiê se espalham em montículos luzentes como brasas, ou, então, para as rumas de prata, do comprimento de um archin, jazendo em torno da roda. Quando ainda me aproximo da sala de jogo e ouço, a uma distância de duas salas, o tinir das moedas, quase chego a ter convulsões”.

Alegria de Defunto: Quincas Berro Dágua

jun
2012
12

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Quando li Jorge Amado pela primeira vez na adolescência, por dever escolar, não gostei do estilo nem da temática do autor: tudo me parecia excessivamente vulgar, uma literatura sem maiores elaborações estéticas. No auge do desespero em busca de algo bom pra ler, eis que me vejo escolhendo um romance do autor baiano, na esperança de que uma nova leitura, mais madura, pudesse me reconciliar com a sua literatura. Li A morte e a morte de Quincas Berro Dágua em pouco mais de duas horas, achando delicioso e morrendo de rir das peripécias do defunto festejador. O que se vê nas páginas da novela é uma literatura muito sofisticada, e o que me pareceu vulgar naquela leitura de adolescência é, na verdade, uma prosa muito fluente, leve, fácil, que revela um profundo domínio sobre a língua e sobre a cultura popular da Bahia. Terminei o livro com a vontade de esgotar toda a obra do autor! Quincas Berro Dágua é o completo malandro do cais de Salvador: beberrão, libertino, deixou mulher e filha (duas jararacas, no dizer de Quincas) para ter uma vidade alegrias e liberdades. Até depois de morto o malandro apronta das suas e o seu velório tem direito a uma festança regada a cachaça e muito amor. Para morrer de rir.



“Era o cadáver de Quincas Berro Dágua, cachaceiro, debochado e jogador, sem família, sem lar, sem flores e sem rezas. Não era Joaquim Soares da Cunha, correto funcionário da mesa de rendas estadual, aposentado após vinte e cinco anos de bons e leais serviços, esposo modelar, a quem todos tiravam o chapéu e apertavam a mão. Como pode um homem, aos cinquenta anos, abandonar a família, a casa, os hábitos de toda uma vida, os conhecidos antigos, para vagabundear pelas ruas, beber nos botequins baratos, frequentar o meretrício, viver sujo e barbado, morar em infame pocilga, dormir em um catre miserável?” (Editora Cia das Letras, 2008, pg. 24)

A Morte no Japão: A Partida

jun
2012
11

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Ontem assisti ao filme japonês de Yojiro Takita chamado A Partida. O enredo é focado na vida de Daigo Kobayashi, um violoncelista desempregado que precisa voltar para sua cidade de origem para conseguir um trabalho. Daigo é admitido na pequena empresa de Sasaki, dedicada à preparação dos mortos para os rituais de cremação. Daigo passa, então, a enfrentar as dificuldades do seu novo ofício: o asco que sente dos cadáveres, a incompreensão da esposa, a rejeição de seu grupo de amigos, o trauma motivado pelo abandono do pai. O filme é muito delicado e revela toda a beleza e o respeito pela perda que envolve o trabalho de Sasaki-san. Pode parecer bem dramático, mas o filme é surpreendentemente leve, em especial pela atuação do intérprete de Daigo, que nos cativa pela inocência do personagem. Uma história para sorrir e chorar.

Eugénie Grandet: Pobre Herdeira Rica

jun
2012
10

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Algumas semanas depois de ler A Mulher de Trinta Anos, eis que deparo com a Eugénie Grandet de Balzac e estou aqui para dizer o que achei da leitura. Posso dizer que a história de Eugénie é muito mais interessante que a de Julie: filha de um proprietário de terras da província, Eugénie é uma rica herdeira sem atrativos físicos ou intelectuais, que vive em estado de extrema penúria apesar da riqueza do pai, um avarento com todo o exagero que a literatura pode conceder a um romancista. A vida de Eugénie é pobre em afetos, sem paixões, até conhecer o primo parisiense, Charles Grandet, que chega arruinado à casa do tio, filho de um pai falido que se suicida em meio à bancarrota. Eugénie se apaixona e toda a trama de sua vida adquire contornos novos, novas expectativas. A história é viva, os personagens bem construídos, a leitura flui muito bem e o pessimismo realista da literatura madura de Balzac está lá. Eugénie Grandet me deixou uma impressão muito melhor que A Mulher de Trinta Anos e recomendo a sua leitura para os amantes do romance clássico francês!




“Os avarentos não acreditam na vida futura, o presente é tudo para eles. Essa reflexão lança uma luz horrível sobre os dias de hoje quando, mais do que em qualquer outra época, o dinheiro domina as leis, a política e os costumes. Instituições, livros, homens e doutrinas, tudo conspira para minar a crença em uma vida futura sobre a qual o edifício social está apoiado há mil e oitocentos anos. [...] Pensamento aliás inscrito em toda parte, até nas leis, que perguntam ao legislador: “Quanto você paga?”, em vez de dizer “O que você pensa?”. Quando essa doutrina tiver passado da burguesia para o povo, o que será do país?” (Editora Estação Liberdade, 2009, pg. 123)

Liberdade e Sexo: Philip Roth

jun
2012
09

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A literatura norte-americana não costuma ocupar tanto a minha atenção, a não ser por alguns poucos grandes escritores que têm um cantinho fiel na minha prateleira. Um deles é Philip Roth, autor de origem judaica que escreveu, entre outras obras, A Marca Humana, O Fantasma sai de Cena e Nêmesis. Todos os livros que li de Roth foram excelentes e me fizeram refletir sobre questões muito profundas e filosóficas com fluidez e leveza. O livro desta semana foi O Animal Agonizante. Na história, David Kepesh, um crítico de arte bem sucedido, solteirão convicto, conhece Consuelo Castillo, uma jovem estudante de origem cubana, bela e exuberante. David vivenciou a revolução sexual dos anos sessenta e se considera uma cria bem sucedida da liberdade conquistada por essa geração: sem amores certos e vínculos, David se considera emancipado e experimenta o sexo sem maiores consequências afetivas. Ao conhecer Consuela, David desenvolve uma adoração obsessiva e sexual que o faz fraquejar e questionar se é, de fato, livre. A leitura é eletrizante, e os temas de fundo da literatura de Roth estão presentes: a velhice, a prisão das convenções sociais, o puritanismo americano, a decadência intelectual e física. Vale cada página!




“Para aqueles que ainda não são velhos, ser velho significa ter sido. Porém ser velho significa também que, apesar e além de ter sido, você continua sendo. E ter sido ainda está cheio de vida. Você continua sendo, e a consciência de continuar sendo é tão avassaladora quanto a consciência de ter sido. Eis uma maneira de encarar a velhice: é a época da vida em que a consciência de que a sua vida está em jogo é apenas um fato cotidiano. É impossível não saber o fim que o aguarda em breve. O silêncio em que você vai mergulhar para sempre. Fora isso, tudo é tal como antes. Fora isso, você continua sendo imortal enquanto vive.”

Nefelibatas e Lunáticos: Cyrano de Bergerac

jun
2012
06

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De vez em quando bate um cansaço tão grande do mundo e das gentes que a vontade é de passar uma temporada em terras mais distantes. Como a lua é sempre um dos destinos hipotéticos dos que não estão na órbita do cotidiano, deixo o trechinho da obra Viagem à Lua, de Cyrano de Bergerac (tradução de Fulvia Moretto, edições Globo), como inspiração pré-feriado. Aproveitem bem o dia de amanhã!



“Era lua cheia, o céu estava claro, e haviam soado nove horas da noite quando voltávamos de uma casa próxima a Paris, quatro amigos e eu. Os diversos pensamentos que nos provocaram a visão daquela bola de açafrão nos entretiveram no caminho. Com os olhos mergulhados naquele grande astro, ora um de nós o tomava por uma lucarna do céu, através da qual entrevíamos a glória dos bem-aventurados, ora um outro protestava que era a platina em que Diana prepara as voltas de Apolo, ora outro exclamava que poderia perfeitamente ser o próprio Sol que, tendo à noite se despojado de seus raios, olhava através de um buraco o que se fazendo no mundo quando ele lá não mais estava.

‘E eu’, disse, ‘que desejo misturar meu entusiasmo ao vosso, creio, sem me deter nas imaginações desabridas com o que estimulai o tempo para fazê-lo avançar mais depressa, que a Lua é um mundo como este, ao qual o nosso serve de lua.”

Ócio Odioso: A Luta de Sabino

jun
2012
06

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Muitos de nós, escritores ou não, já tivemos os nossos dias de dificuldades na escrita. Pensando nesses momentos de falta de inspiração,  trago um trechinho da crônica Lutar com palavras, do escritor mineiro Fernando Sabino, publicada na coletânea A Chave do Enigma (editora Record, pg. 122).




“Posso imaginar o que pensarão de nós (que vivemos de escrever e por isso ficamos em casa o dia todo lutando com as palavras), aqueles que têm de enfrentar o trabalho na cidade, saindo de manhã e só voltando à noite. Certamente nos tomarão por vagabundos, pelo conceito tradicional de trabalho, segundo o qual para exercê-lo é condição fundamental sair de casa.

[...]

Fica-se à toa, andando de um lado para outro, com incursões à cozinha para tomar um copo d´água ou comer uma banana. Um cigarro fumado à janela, uma revista velha lida no banheiro. De vez em quando uma olhada com ódio para a máquina de escrever, onde o papel em branco nos espera. Escrever o quê?”

As Mulheres de Molière

jun
2012
05

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Só um gênio do teatro como Molière seria capaz de criar uma obra-prima no século XVII (1643) capaz de atravessar os tempos e permanecer atual e engraçada para um leitor dos dias de hoje. Na comédia Escola de Mulheres (tradução do eterno Millôr Fernandes), o tema é o adultério feminino ou, mais especificamente, o temor de Arnolfo em ver a sua testa “ornada”, no dizer do francês. O protagonista passa a vida a rir da desgraça alheia e maldizer a falta de pulso dos homens, quando resolve se casar. Obcecado pela ideia de ser traído, Arnolfo toma a jovem Inês desde os quatro anos, mantendo-a sob os cuidados de uma ama para que se transforme numa mulher tão estúpida quanto submissa. É muito divertido acompanhar o desenrolar da comédia, o aparecimento do galã Horácio, as peripécias de Alain e Georgette, e, claro, perceber como Inês acaba aprendendo direitinho a dobrar a submissão e encontrar a doçura dos prazeres! Vale a leitura atenta.




“Caso com uma tola para não bancar o tolo. Acredito, à fé de Deus, que a sua é uma mulher sagaz; mas uma mulher esperta é mau presságio; eu sei o que custou a alguns casarem com mulheres cheias de talento; me caso com uma intelectual, interessada apenas em conversas de alcova, escrevendo maravilhas em prosa e verso, frequentada por marqueses e gente de espírito, e fico sendo apenas um marido de madame, discreto a um canto, como um santo sem crentes”. (Editora Paz e Terra, pg. 11)

Receitas para a Alma: Héctor Abad

jun
2012
04

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Poucas coisas são tão desoladoras quanto o fim de tarde de domingo, ainda mais quando se está doente, o corpo enfraquecido, a cabeça meio vazia e o coração do tamanho de um botão. Nesse estado de espírito fraco, saí em busca de alguma leiturinha na livraria, e, como às vezes parece acontecer, tinha um livrinho especial esperando por mim nas prateleiras, de um escritor querido: Livro de Receitas para Mulheres Tristes, do colombiano Héctor Abad Faciolince. Já falamos do escritor neste post, e aproveito para compartilhar com vocês mais esse achado literário. Tenho certeza que pode trazer um pouco de leveza para o domingo existencial de muita gente. Boa segunda!




“Nas tardes de chuva fina e persistente, se o amado estiver longe e o peso invisível de sua ausência for insuportável, colha de sua horta 28 folhas de melissa e leve-as ao fogo num litro d’água, para um chá. Quando a água ferver deixe o vapor molhar a polpa de seus dedos e mexa três vezes com uma colher de pau. Tire do fogo e deixe descansar por dois minutos. Não ponha açúcar, beba gole a gole de costas para a tarde, numa xícara branca. Se depois de meio litro você não notar certo alívio atrás do esterno, requente o chá e acrescente duas colheres de raspas de rapadura. Se no fim da tarde a agonia persistir, pode ter certeza que ele não vai voltar. Ou vai voltar outra tarde, e já muito mudado”.

As Cores do Deserto: O'keeffe

jun
2012
03

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Georgia O’keeffe nasceu em 1887 nos Estados Unidos e faleceu em 1986. É considerada o nome do modernismo norte-americano. Sua obra retrata a paisagem da fazenda Sun Prairie, com cores e formas inovadoras e dançantes. Cores para inspirar o nosso domingo de sol.



Uma constante nos temas de O’keeffe são as flores, representadas sob uma luz de difusa que nos remete a uma imagem de sonho.



Bom começo de semana!

Visão do Amor: Juana Gorriti

jun
2012
01

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Deixo a vocês um trecho do conto A Filha do Mazorqueiro, de incrível força narrativa, da escritora latino-americana Juana Manuela Gorriti, publicado na coletânea Contos de Amor do Século XIX, da editora Cia das Letras. Bom fim de semana!





“A mãe uniu as mãos e contemplou com religiosa admiração aquela belíssima jovem cujo véu branco, enrolado como uma auréola em torno de seu rosto, parecia iluminar as trevas que a cercavam e que, debruçada sobre seus filhos como o gênio da misericórdia, cobria-os com um olhar de ternura e dor. A pobre mulher acreditava ser ela um anjo que descera à Terra atendendo a seus rogos; e, imóvel, temia que um gesto, um sopro, desmanchasse a divina visão, devolvendo-a à terrível realidade. E quando Clemência se aproximou de seu leito, a simples filha do povo estendeu ansiosamente a mão para tocar as dela e se convenceu de que não era uma aparição sobrenatural”.