Malas Prontas para Pasárgada

mai
2012
21

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Drummond dizia precisar do Outro, chamava os companheiros para um abraço, fez um poema sobre dar as mãos e viver sempre em unidade. Eu, ao contrário do poeta, tenho medo do Outro. Ele que está sempre à espreita, pronto para gritar, agredir, invadir, punir. Hoje eu não quero o Outro. Hoje eu quero apenas a beleza de um bom poema. O Outro que fique por aí, solto no mundo, com suas queixas e palavras de infelicidade. Aqui neste universo azul que é o meu quarto, sob os lençóis impregnados com o cheiro do descanso, os lírios que morrem com o passar sensível dos minutos, eu só preciso de mim mesma e dos sonhos de uma Pasárgada distante. O que a gente faz quando está “triste de não ter mais jeito”? Boa semana a todos!


 

Vou-me Embora pra Pasárgada

Manuel Bandeira




Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei




Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive




E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada




Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar




E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada