Os Gatos e as Radiolas


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Preciso ser justa: eu me rendi. Quando Saulo chegou em casa com uma radiola (!) embaixo do braço, só pensei que se tratava de uma excentricidade injustificável: aquele aparelho envolvia uma tecnologia delicadíssima e relativamente inacessível, seria necessário comprar inúmeros complementos, discos, enfim, era preciso reaprender a ouvir música, quando tínhamos ipod, um som razoável, computadores, várias máquinas, grandes ou pequenas, para emitir ruído. Passei cerca de um mês olhando para a radiola com a desconfiança de um gato (e me parece que gatos gostam de radiolas, porque o nosso gostou tanto dela que passou a tirar sua soneca da tarde em cima da dita cuja). A desconfiança era plausível: era a chegada de um aparelho enorme quando eu pensava em tirar da sala quase tudo, deixando o espaço limpo e ordenado, além de que Saulo começou a rivalizar pela sala, comportamento intolerável, já que sou tão dependente dos meus jogos de futebol. Mas eis que começaram a chegar os primeiros discos. Uma coleção herdada do meu sogro, com algumas preociosidades: um vinil do Nat King Cole cantando em espanhol, aquela voz que abraça a gente e tira para dançar. E chegaram outros, porque encontrar discos passou a ser um divertimento para Saulo: Chet Baker e os seus sopros, Billie Holliday, The Beatles, Simon and Garfunkel, Chico Buarque, enfim, muitas vozes na minha sala de estar...Vozes quentes, vozes que parecem cantar mais devagar e nos deixar mais relaxados. Ontem à noite foi a rendição absoluta: só pensava em chegar em casa e colocar o vinil para girar. E foi ótimo, fiquei feliz intimamente com aquela música tão linda e tão acessível ao meu desejo. Só uma coisa ainda não me convenceu: que chateação imensa isso de trocar o lado, ein! Para isso, não dá, já sou da geração da preguiça e não me renderei jamais: voto pela criação de vinis que tenham um lado só. Canta, Nat!
 


 
Em homenagem ao meu testemunho musical, vou deixá-los com mais uma canção, a música mais linda de todos os tempos, cantada pela Ella Fitzgerald e o Louis Armstrong, The nearness of you. Boa quinta-feira, amigos!
 


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