A Ilusão do Tempo


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Mês após mês, no ano de 2012, eu alimentei a fantasia de que haveria uma vida após depósito da tese. Um mundo de possibilidades se abriria: o tempo, elástico, seria bastante para cuidar do corpo, da cabeça, para dormir mais e passar mais tempo com os amigos. Eu poderia usar o tempo fora do trabalho com qualquer coisa que não fosse trabalho. Um tempo livre. Ouvir música, fazer yoga, ajustar aquela pia do banheiro que precisa de um reparo, cuidar da reforma do gesso do teto, enfim, a vida-nossa-de-cada-dia, “sem mistificações”. Um tempo para mim. Essa ilusão não resistiu aos primeiros dias depois que eu consegui, finalmente, colocar um ponto final no texto, imprimir e entregar na universidade o filho pronto – cheio de imperfeições, jogado à hostilidade da vida fora do gabinete. A sensação de urgência está aqui, minuto após minuto. Seja como ideia – uma impressão de que o tempo está passando, o relógio é implacável, a vida não pode ser perdida – seja como realidade, o trabalho em si mesmo, a ida ao banco, os imprevistos, o supermercado por fazer, as oportunidades profissionais que a vida joga no seu colo e você não pode, simplesmente, ignorar – especialmente quando se tem vinte e poucos anos.




A libertação do relógio é um processo que só pode ser vivido intimamente – não depende de um depósito, de um dia no calendário, de uma confirmação do outro. É um estado mental. O estado de quem se permite, simplesmente, desacelerar. Estou ensaiando um grande passo, um passo íntimo, mas fundamental: desabilitar a opção do celular que permite a sincronização com a conta de e-mails em tempo real. Quando eu conseguir conviver com a ideia de que os e-mails estão chegando, as pessoas estão me procurando, os problemas continuam a existir e, não obstante, aquele intervalo entre as três e as quatro da tarde é meu e somente meu – inclusive para vivê-lo em silêncio – creio que eu estarei, finalmente, liberta.